ARTIGO: TRADUZINDO A INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE NO DIREITO BRASILEIRO

Um tema relevante e sempre atual no âmbito jurídico diz respeito à investigação de paternidade, uma vez que a questão é intrínseca a própria origem de cada indivíduo, ao direito da pessoa de conhecer, conviver e receber o devido amparo de seu genitor.

No Direito Brasileiro, existem três critérios para definir a paternidade. São eles: o critério jurídico, o critério biológico e o critério socioafetivo. Desde já é importante destacar que não existe hierarquia nem qualquer diferença entre os critérios de paternidade.

O critério jurídico encontra previsão no artigo 1.597 do Código Civil. Trata-se de uma presunção legal de paternidade em razão do casamento, na qual se considera o marido da mãe como o pai da criança. O dispositivo legal apresenta hipóteses relacionadas a circunstâncias específicas, tais como o dia do nascimento da criança (são considerados filhos os nascidos pelo menos cento e oitenta dias depois de estabelecida a união, bem como os nascidos nos trezentos dias seguintes à dissolução da sociedade conjugal) e os nascimentos oriundos de fecundação artificial.

Por sua vez, o critério biológico estabelece como pai aquele indicado no exame de DNA, ou seja, a paternidade é constatada através de perícia genética.

O critério socioafetivo é aquele no qual prevalece o vínculo construído com a convivência entre o pai “de criação” e a criança. Diz respeito à chamada posse do estado de filho, comprovada basicamente por três elementos: nome, trato e fama. A criança (na verdade, indivíduo de qualquer faixa etária, uma vez que é possível o reconhecimento da paternidade a qualquer tempo, como será tratado adiante) deve ter utilizado o nome do pai ao qual ele identifica como tal, além de sempre ter sido tratado como filho e reconhecido como tal não apenas pelo presumido pai, mas também pelo público, pela sociedade de forma geral. Informalmente, é possível afirmar que se trata da institucionalização no Judiciário da máxima popular que diz “pai é quem cria”.

Oportuno esclarecer que a paternidade socioafetiva (decorrente do convívio) não serve para desconstituir o registro de nascimento naqueles casos em que o pai biológico registrou o filho, tampouco o “pai de criação” que registrou voluntariamente a criança poderá posteriormente pedir a exclusão do seu nome da certidão de nascimento. O ato de reconhecimento de filho é irrevogável. A paternidade socioafetiva serve para manter o registro de nascimento ou possibilitar o registro posterior, uma vez que tem por objetivo a proteção da criança, o interesse do menor sempre prevalece.

Existem quatro tipos de ações para discutir a paternidade no Direito Drasileiro.

A Ação Negatória de Paternidade tem por objetivo alterar o registro de nascimento. Busca afastar a presunção legal decorrente do artigo 1.597 do Código Civil. Quem pode ingressar com esta ação é o marido da mãe, casado à época do nascimento da criança. O fundamento legal está no artigo 1.601 do Código Civil. Para o êxito da ação é necessária a prova da ausência de vínculo afetivo entre o pai registral e a criança. A ação pode ser ajuizada a qualquer tempo.

Outra ação é a Anulatória de Registro, a qual encontra fundamento no artigo 1.604 do Código Civil. Qualquer interessado (pai biológico, pai socioafetivo, filho, mãe) pode ingressar com a demanda, mas a lei exige a comprovação da ocorrência de erro ou falsidade no registro. Esta ação também pode ser usada para reconhecer a paternidade. Existe discussão entre os doutrinadores brasileiros quanto a existência ou não de prazo para ingressar com a ação. Parte entende que o prazo seria de quatro anos, observando assim a regra geral para a anulação dos atos jurídicos. Outra parte da doutrina entende que se trata de ação referente ao estado da pessoa, portanto imprescritível.

A Ação Impugnatória de Paternidade é a ação do filho que não deseja ser reconhecido pelo pai. Está fundamentada no artigo 1.614 do Código Civil, o qual estabelece que o filho maior não pode ser reconhecido sem consentimento. O prazo para ingressar com a ação é de quatro anos a contar da maioridade.

Por fim, a mais popularmente conhecida é a Ação Investigatória de Paternidade. Apesar de ser mais comum a busca pelo pai biológico, na verdade esta ação judicial serve para investigar tanto o pai quanto a mãe. Trata-se de ação cuja legitimidade para ingressar em juízo é exclusiva do filho, sendo que a ação pode ser ajuizada a qualquer tempo, nos termos do artigo 27 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

É importante destacar que a recusa do suposto pai em se submeter a realização do exame de DNA encontra fundamento no artigo 5º da CF. Para fins de julgamento no processo, a recusa em fazer exame gera uma presunção de que o investigado seria, efetivamente, o pai biológico. Esta presunção admite prova em contrário (presunção relativa), está fundamentada nos artigos 231 e 232 do Código Civil e tem aplicação pacífica nos julgamentos, sendo inclusive matéria da Súmula Nº 301 do Superior Tribunal de Justiça.

Finalmente, cabe informar que em recentes julgados o Judiciário tem autorizado a inclusão do nome do pai ou da mãe socioafetivos no registro de nascimento, passando assim o indivíduo a ter dois pais ou duas mães em seus registros¹. É o Direito acompanhando as mudanças da sociedade.

¹Por exemplo, ver as seguintes reportagens:
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI241650,51045-Preadolescente+tera+dupla+paternidade+em+registro+civil; http://www.tjrs.jus.br/site/imprensa/noticias/?idNoticia=291195

FONTE: Por Cassiano Cordeiro Alves, advogado da equipe Xavier & Longaray Advogados